segunda-feira, 28 de outubro de 2013

Amarelo-sorriso

Nas últimas semanas,... Não, nos últimos meses, as pessoas vêm me perguntando recorrentemente se "está tudo bem". Não que elas realmente se importem, mas preciso lidar diariamente com uma das características que eu mais gostaria de mudar em mim, a transparência. Também recorrentemente tenho pensado que não consigo mesmo esconder qualquer tipo de náusea ou dor, não sou capaz de oferecer mais que um sorriso amarelo pra quem me estende a mão. Acho que a boca fala mais que os olhos. Consigo facilmente estampar toda a felicidade que não existe com os olhos e ironicamente não consigo sorrir com a boca. No máximo, dentes amarelos expostos, forçadamente, como um ritual supersticioso tentando em agonia convencer as pessoas de sua eficácia e legitimidade. 
Talvez por isso essa coisa de sempre ver o copo meio vazio. Talvez por isso essa incredulidade em mim e nos lugares aos quais posso chegar. É possível que seja mais fácil mesmo me sabotar e destruir um pouquinho de cada vez pra ao menos dar algum sentido para os sorrisos amarelos e pro simulacro de felicidade nos olhos. Indo mais fundo, talvez criar esses sentidos que tentariam legitimar tanta dor seja bastante eficiente em ocultar as verdades escondidas que não tenho coragem de encarar. As verdades que me fizeram ter as coisas mais bonitas nas mãos e deixar que partissem, me deixando flutuar à deriva na segurança da superficialidade.
Os olhos mentem e podem encarar somente o que escolho enquadrar a partir das inclinações do meu pescoço. Mais que isso, eles acreditam no reflexo da água escura, que pinto com pequenas desilusões, mas cujo real conteúdo esconde os monstros mais aterrorizantes. A boca, não. Mesmo calada, tem muito a dizer; mesmo quando ensaia um sorriso, não consegue esconder aquele tom amarelado, seja pelos cigarros, seja pela dor.

terça-feira, 5 de março de 2013

Talvez eu já sinta falta do que tenho tanto medo de sentir falta. Pode ser que isso não se perca naquela cidade cinza ou em qualquer outro lugar, mas já esteja perdido, irrecuperável, no passado.

terça-feira, 27 de novembro de 2012

Sempre tive muita dificuldade de aceitar minha condição de sagitariano com ascendente em sagitário. Digo isso porque a vida já me deu grandes possibilidades de aventuras e a minha resposta sempre foi uma só: saudade. Saudade de casa, das velhas pessoas e do aconchego. O esperado do bom sagitariano seria romper com essas âncoras do lar e ganhar o mundo, sentir todos os cheiros, os gostos e voar livre e sem destino por aí. Isso me incomoda. Sempre incomodou.
Na realidade, esses dias concluí que sou, no final das contas, um apaixonado. Apaixonado como só um sagitariano com ascendente em sagitário poderia ser. Que culpa eu tenho se acho que os melhores gostos, cheiros e pessoas estão bem aqui na minha mão? Acredito que os sagitarianos normais procuram sentir o sangue nas veias com coisas diferentes, pousando indiferentes aqui e ali. O ascendente em sagitário, por outro lado, nos torna amantes intensos das coisas a ponto de não precisarmos deixá-las pra sentir o seu calor.
Por isso, o amor não vale muito sem paixão. Como sagitariano com ascendente em sagitário, preciso de olho no olho, toque, sacanagem e surpresas. Preciso de tesão e o novo nem sempre surpreende, quase nunca é melhor. Acho que o que supera mesmo as nossas expectativas é quando o inusitado vem dos lugares que a gente já conhece tão bem que nem espera mais esse tipo de coisa. Do novo a gente não sabe o que esperar e acaba sempre querendo mais e melhor. É a velha história, too many fucking expectations, too many fucking disappointments.
Pro azar dos sagitarianos com ascendente em sagitário, nem sempre as nossas antigas pessoas são fonte inesgotável de olho no olho, toque, sacanagem e surpresas. Nosso sangue continua fervendo pelas mesmas coisas, mas o calor por vezes não consegue chegar ao outro. O fogo que a gente insiste em cultivar não faz muito sentido pra quem é diferente e a cada investida negada, a cada brilho que não emociona, a cada gota de esperma derramada feito algo desimportante, o sagitariano com ascendente em sagitário morre um pouco. Poderia passar a vida reinventando o de sempre, mas conviver com o frio congelante que se apodera aos poucos do espaço entre dois corpos é impossível. Sei lá, só sei que é preciso paixão.

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O tempo das coisas


Engraçado olhar fotos antigas e perceber o tempo que faz das coisas. No fim das contas, o tempo é mesmo mais uma percepção do que voltas dos ponteiros no relógio ou folhas arrancadas do calendário. E pra mim, você faz muito tempo, mesmo que na verdade nem seja tanto assim. É que eu sorria nas fotos que me encaravam nessa madrugada de domingo e isso me fez perceber que faz tanto tempo de tanta coisa, por mais que as voltas no relógio nem tenham sido assim exageradamente demoradas e as folhas do calendário não tenham virado tantas vezes quanto eu imaginava. Isso tudo porque você foi bom. Você é bom. As coisas e as pessoas têm de ser boas pra transformar esse tempo pouco, esse tempo pobre, em um tempo grande de perder a conta e o fôlego, em uma saudade assim triste e bonita. E isso que é, isso que foi você, e foi no momento exato, logo depois que eu joguei aquela folha de ontem do calendário no lixo e bem quando os ponteiros se separaram formando o ângulo preciso que o sorriso se abriu. Foi isso que me aconselharam deixar guardado no bolso, mas, que eu penso, preciso me desfazer, jogar fora, exorcizar. Menos em momentos como agora, nas horas que eu sorrio de volta pras fotos que sorriem pra mim e me dão vontade de sorrir um pouco mais em retorno. Agora, a vontade é ficar assim sorrindo e quem sabe ligar, comprar um presente, escrever qualquer coisa pra alguém saber que eu me importo, e o quanto. Me importo tanto quanto o tempo que faz de você e de tanta coisa que era nossa, ou que eu quis e entendi que era nossa, mesmo que tenha sido só minha. Nesse caso, eu te daria o que fosse meu e roubaria o que fosse teu pra transformar naquilo que me enche dessa coisa misteriosa que tá aqui-agora tão presente no quarto cheio dessa madrugada de domingo, isso que eu sinto o cheiro e quase consigo tocar no ar, isso que de tanta, mas tanta saudade e tanto, mas tanto sorriso, parece tanto, mas tanto tempo.

terça-feira, 25 de setembro de 2012

Eyes don't see, hearts don't feel



Já disseram antes e em algumas linhas bonitas que amar é conseguir ver e desamar é não enxergar mais. Foi tanto dissabor que o que resta é acreditar nessa capacidade da gente de tentar fazer as coisas. Tentar chegar lá. Você costuma dizer que eu não tenho fé, mas acho que é precisamente o oposto. Tenho tanta fé que não preciso depositá-la nos seus orixás ou espíritos de luz. Ela está toda em mim. Já disse várias vezes sobre como esse amor transbordando é meu e só meu e você se apossou um pouco sem o meu consentimento.  E é sobre essa possibilidade de amar e desamar que eu queria te falar.
Como talvez em determinada circunstância, depois de tanto tempo... Olhei sem querer o calendário agora e percebi que logo hoje o tanto tempo se tornou dois anos e sete meses de nós, e a gente já nem se dá conta. Pois é tanta experiência acumulada, a antítese dos sentimentos, os maiores sorrisos e as lágrimas mais amargas que a gente já vê e conhece tudo. E se conseguir enxergar for exatamente o que já não permite mais amar? Se essa precisão cirúrgica no olhar, essa lente de aumento, mostrar o lado escuro de nós? Quem sabe a distância impossível, depois de tanto tempo e tantos nós, fosse o melhor?
Pensando nisso, voltei à minha fé, à minha crença inabalável em mim e escolhi me entregar de novo. Escolhi fechar os olhos e pular nos teus braços como antes. Agora que nós abrimos mão do mundo inteiro, o que nos resta senão a felicidade? Quando todas as telas e todas as bocas berrarem, é a tua voz que eu quero ouvir. É uma escolha, mas não acho que se trate tanto assim de ver ou não ver. É algo mais profundo, é aquele desespero que grita durante todas as noites insones atordoadas por pílulas brancas, a tentativa, a escolha da felicidade.

domingo, 8 de abril de 2012

Sobre respingos e um herói

Aquele momento na hora do porre em que todos os fluidos misturados no estômago querem ganhar a liberdade novamente. Mas você precisa mantê-los ali pelo menos até conseguir chegar a um lugar seguro, onde os pedaços grossos do vômito caindo no chão não respinguem pra sujar a sua cara estragada por todas essas noites desesperadas.
Você sente medo. É preciso segurar os líquidos aqui dentro, contidos até o momento exato. Só que eles começam a apodrecer e a cheirar mal, afinal dentro do seu de dentro não é precisamente o lugar mais limpo e claro do mundo. São tantas mágoas afogadas em tantas bebidas fortes e tantos cigarros que aquilo tudo vira uma ferida infeccionada e a dor é difícil de segurar. Você precisa colocar tudo isso pra fora. 
Só que tem aquilo, os pingos. É como se no momento eu estivesse sentindo essa vertigem em frente a um espelho e ceder às tentações da náusea iria jogar o vômito todo na minha própria cara.
É preciso esperar. Esperar o momento exato, quando tudo estiver limpo e a distância não for mais entre nós dois, mas seja entre mim e mim. Só que é irônico como ao mesmo tempo em que eu espero a sua mão pra segurar a minha cabeça na privada imunda, também imagino o nojo que você vai sentir. O seu desprezo me apavora e eu chego a pensar que se for pro nosso bem, eu seria mesmo capaz de segurar esse vômito aqui dentro pra sempre e deixá-lo apodrecer e me corroer e se tornar tumor e me matar. Se isso for te fazer feliz, eu consigo. 
Consigo aceitar que você transfira os seus próprios fluidos odorosos pela minha boca, garganta e os deposite escondidos naqueles lugares lá dentro que eu penso em nunca te mostrar, por mais que me matem. Parece virtuoso colocado dessa maneira, e eu acho que de fato é. Agora as noites insones estão acabando e eu já começo a me perguntar até quando vou conseguir brincar de herói pra salvar a gente de ti.